Poema

Asnildo e a loteria

Já tinha decidido,
tentaria ficar rico.
Pegou seu carro bonito,

abriu, no botão, a garagem,
não levou uma bagagem,
e saiu para esta viagem.

Cruzar a cidade precisava,
a lotérica longe ficava,
e era tarde, quase fechava.

Perder tempo não podia,
avenida subia, rua descia,
até que uma hora, não ia.

A via estava congestionada,
de ponta a ponta parada,
devido carreta quebrada.

Porém, existia um atalho:
Viela Boteco do Gargalo,
onde havia bebida e baralho.

Asnildo sabia bem disso,
lá bebia, comia chouriço,
e sempre fazia reboliço.

Daí subiu na calçada,
xingou a moça parada,
e à direita deu entrada.

Dar seta, nem se preocupou,
na viela do boteco passou,
mas ainda, não chegou.

Precisou ir mais depressa,
dirigiu rápido à beça,
aproveitou cada brecha!

Quase atropelou um ciclista;
agia como dono da pista,
tal galo bravo, sem crista.

Estando próximo ao lugar,
um policial o fez parar.
e documentos pediu mostrar.

Enquanto o guarda esperava,
cada detalhe observava:
e viu que cinto não usava.

Então, chamou-lhe a atenção,
pelos erros, pela má direção.
e as multas já estavam na mão.

Como se tal não bastasse,
Asnildo tratou que aumentasse:
achou que a propina o liberasse.

Entre tantas barbeiragens,
mais essa derrapagem,
todavia, sem camaradagem.

Correto que era o agente,
ante a proposta indecente,
o encaminhou diretamente

ao delegado de plantão,
que pediu lavrasse, ao escrivão,
enquanto lhe dava sermão.

Seu telefonema fez chamar
um advogado caro a cobrar,
para, só em parte, lhe amparar.

Quando enfim foi liberado,
o lugar que ia, estava fechado.
Sem carro, sem jogo, abandonado.

Os catorze pontos da loteria,
muito mais do que queria,
conseguiu na travessia:

no prontuário, vinte pontos
e menos rico um pouco,
porém vivo e ainda solto.

De ônibus, foi para casa.
Sua mulher, que o aguardava,
disse-lhe em bom português:
- Meu Asnô, aprendeu dessa vez?

JERÔNIMO, J.R. Vias e Versos - por um trânsito mais seguro. Guarulhos, Ed. do Autor, 2ª edição, 2024, p 22.

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