Crônica

Não dar seta também é sinal1

Logo adiante, no alto de um pequeno aclive, Pécias parou seu veículo, devido à interseção sem sinalização. Embora se encontrasse à direita do automóvel que seguia na transversal, a via em que estava Pécias era de menos movimento. De forma que ele ponderou aguardar a passagem do outro.

E este, muito lentamente, foi se aproximando do cruzamento. Como não sinalizava, deu a entender que continuaria seu curso, reto, mantendo-se na mesma via. Por isso, Pécias, mesmo com pressa, não avançou; aguardou sua passagem. Também porque seu carro era velho, com manutenção desatualizada, não favorecendo as arrancadas precisas e seguras.

No entanto, quando o carro chegou na interseção, de repente, se lançou para a via onde estava Pécias, em vez de seguir direto. Este se enfureceu, pois se soubesse que aquele veículo fosse entrar à direita, já teria avançado há muito tempo e não esperado em vão.

Devido à indignação de Pécias pela barbeiragem do outro, por não ter acionado a seta, deu uma longa buzinada em protesto. Não xingou, não gesticulou e nem falou qualquer palavra ao imprudente condutor. Ocorreu, porém, que mesmo assim este, numa manobra imprevista, colocou seu carro no mesmo sentido do de Pécias e iniciou uma perseguição.

"Era só o que faltava!", pensou Pécias. "Além de me atrasar com sua trapalhada, ainda quer confusão."

Pécias não tinha interesse em conflito. Sabia que isto retardaria mais seu compromisso e que poderia, igualmente, trazer outras possíveis consequências negativas, para todos os envolvidos. Então, rumou direto para a delegacia mais próxima. Só que, pela potência do outro veículo, o perseguidor chegava cada vez mais perto. Já ameaçava dar uma fechada para bloquear o carro de Pécias.

Por sorte, uma viatura da Polícia Civil estava no caminho. Assim que Pécias parou, o outro condutor, sem perceber a presença policial, tomou a frente na rua, impedindo a passagem. De imediato, Pécias se comunicou com os policiais sobre o que estava acontecendo e o motivo. Antes da ação dos agentes, o perturbado condutor se deu conta da situação. Com medo de ser pego, arrancou seu carro dali, sem dar tempo para que a placa fosse anotada.

Sabe-se lá o que teria havido se a polícia não estivesse naquele local e hora.

No cotidiano do trânsito pode-se constatar que o cidadão que conduz seu veículo desrespeitando a lei e o direito dos demais usuários das vias é o mesmo que normalmente não reconhece seu erro, e parte para o confronto, quando contrariado.

Tanto, que se pode mesmo fazer esta pergunta:

— Por que alguém que negligencia a condução de seu veículo seria ponderado repentinamente, diante de uma reprimenda vinda de outro condutor? "Improvável", é a resposta mais adequada, pelo que se confirma na prática. É plausível que se portaria diferente caso o outro demonstrasse mais força ou poder, pela ameaça que lhe inculcaria.

Logo, a percepção de que outros não dão seta e infringem quaisquer regras na direção de um veículo é também um sinal de que o certo a fazer no trânsito é manter bastante a atenção. E ter, permanentemente, tolerância para com todos e seguir seu caminho com tranquilidade e paz.

Porém, frente a tantos erros que colocam todos em perigo, nas vias desse país, convém comunicar-se com uma autoridade. Dependendo da circunstância, pode ser um agente de trânsito ou um policial mais próximo. E, conforme o caso, tratar com os representantes públicos eleitos, para que aprimorem as leis, a educação e a fiscalização. Até que um dia, efetivamente, se melhore a convivência e o ambiente.

1. JERÔNIMO, J.R. Peri & Pécias no Trânsito - Crônicas, Guarulhos, Ed. do Autor, 1ª edição, 2018, p 43.
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